João
se fora há quatro anos.
Flora
sentia falta do pai, vigiando seu sono, lhe cobrindo, confortando e contando
coisas lindas sobre sua mãe.
Hoje
ela estava só. Cursava letras. Queria escrever sobre tudo o que sentia. Queria contar
histórias que jamais viveu, queria expressar o tanto que sentia, aqueles gritos
que lhe paravam na garganta, aquelas palavras de acalanto sopradas no ouvido
enquanto sonhava. Aquele fogo que lhe consumia.
-
Oi! Tudo bem? – Se aproximou aquela figura rara - Como você se chama?
- Flora!
- Flora!
- Flora... Que nome lindo! De onde vem?
Ela que era sempre fechada a tudo, sorriu sem
querer: Vem de um lençol!
- Ah é? – sorria ele com todos os dentes - De um
lençol, como assim?
- Ahh, longa história... - Nem ela sabia por que
tinha mencionado aquilo.
- Bem, tenho tempo! Minha aula acabou mais cedo
hoje. E a sua?
O calor lhe subia os cachos vermelhos, tinha mais
três aulas...
- João! bem-vindo, amor!
João olhava ao redor e ouvia aquela voz que lhe
acariciava.
Sonhou que perdia o controle do carro enquanto
dormia ao volante.
Que dor forte sentia no peito na hora do choque
contra o mar ao romper a proteção na ponte.
- João! – Ouviu novamente.
A voz ao fundo estava calma. Ele, ainda agitado.
Depois do estrondo, olhava ao redor, nas ferragens,
à procura de alguém além dele. Procurava por Maria, procurava desesperadamente
por Flora...
Não havia mais ninguém.
Apenas ele e o carro mergulhavam, sem amarras,
pesados.
Tentava em vão abrir as portas.
Sentia muita vontade de espirrar, e o espirro não
saía...teve de respirar fundo, mas a água lhe entrava pelas narinas, se afogava...não
dava mais...
Dentro da sua mente, gritava: Maria, eu vou
morrer! O que vai ser da Flora? eu não consigo mais ficar acordado...eu não
consigo mais...
Assim ele passou por cerca de quatro anos do tempo
terreno.
- Estou livre também! E seu nome, qual é?
- João Pedro! – Disse ele sem piscar nos olhos
dela, sem diminuir o sorriso, por dentro dela.
Flora silenciou ao ouvir aquele nome.
Evitando que o silêncio tomasse espaço, ele
continuou:
- Mas me chama de Pedro!
Ela ajeitou a pasta no ombro, como se precisasse desse
movimento para que não caísse. Fosse ela, fosse a pasta...
- Será que posso te chamar de João? – Se lançou,
ainda sem entender seus ímpetos.
- Se tu preferes... Pode sim! – Ele, vários raios
de sol mais alto que ela, dava um jeito de lhe olhar como se estivesse a uma
mesma altura, mais baixo até, sentia ela...
Deitado, João sentia seus olhos cansados arderem. Como
se o calor de um vulcão os atingisse. Mas era seu olhar se refazendo. Como se renascesse.
O tempo todo agitado, à certa altura sentou-se na
grama, ainda sem coragem de levantar as pálpebras:
- Não! Não posso dormir! E se ela... – gritava
desesperado.
- Calma, João. – Serena na voz, Maria passava-lhe a
mão pela testa suada - Calma, amor. Está tudo bem...Sou eu!
- Maria? É você?? – estupefato, João tentava vê-la,
era luz demais!
- Sim, sou eu! É tua Maria, amor! Agora sim! Pode
abrir teus olhos, me abraçar!
Élinson Martins - 16/01/2020
Link para o 2: https://o-taberneiro.blogspot.com/2020/01/aflora-e-fogo-parte-2.html
Link para o 1: https://o-taberneiro.blogspot.com/2016/09/aflora-e-fogo_30.html
Link para o 2: https://o-taberneiro.blogspot.com/2020/01/aflora-e-fogo-parte-2.html
Link para o 1: https://o-taberneiro.blogspot.com/2016/09/aflora-e-fogo_30.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário