domingo, 27 de maio de 2012

FAZ DE CONTO: O Zé do Coco e o mundo verdadeiro



Nordeste brasileiro. Era chuvoso o outono em uma das praias da Bahia. Terça feira à tarde. A chuva forte recomeçara e não havia mais abrigo para quem ia de um lugar a outro tentando aproveitar a estiagem.
Seguiu em passos resolutos entre poças e carros que passavam dispostos a aumentar o banho de chuva dos pedestres. Pensava: é difícil estar numa guerra vestido para um jantar, é mais difícil se entregar à desejada brincadeira de criança, enquanto se está vestido de adulto.

Metros à frente via a tenda de água de coco do Sr. José, o Zé do Coco.
Lhe chamou a atenção ver o seu Zé tirando com um cabo de vassoura a água acumulada na lona. Os bolsões derrubando água, formando poças em frente à tenda.
“E o coco seu Zé?”
“Dois e cinquenta o gelado, dois real o natural”.

O Sr. José tinha 70 e poucos anos e sempre trabalhara com coco. Quando mais novo, “buscava o coco lá em cima no coqueiro”, com 19 assumiu a banca do pai que morreu novo, de “andaço”.

“Andaço seu Zé?”
“É meu filho, a dor andava. Começô no pé, depois foi subindo, foi pra perna, inchô o estômago, foi pará no peito e parou ali e ali fez tudo pará junto com ela”.
“Mas e então, vale a pena vender coco seu Zé?”
“Olha meu filho, se vale a pena eu não sei, meus neto busca os coco, meu filho traz pra mim no carrinho de supermercado, nóis tira um troco. Mas a melhor parte é que nóis une o mundo de verdade com os moço da cidade grande que nem o sinhô”...

Ele ainda olhava pro seu Zé tentando entender que tal união, que mundo de verdade era aquele.

Ainda cheio de sorriso o Sr. Zé concluía: “É meu filho, não tem ninguém da cidade grande que passe aqui, faça chuva ou faça sol, que pegano o coco comigo, ao tomá o primeiro gole, não faça essa cara de criança que tá mamando como o sinhô fez agora há pouco. É a cara de quem prova da natureza meu filho, o mundo de verdade é esse aqui. Aquele que vocês montaram lá eu só vejo pela TV, mas eu num quero ir nunca-nunca visitá”.

Com essa, o sorriso do outro lado dizia: “Até mais seu Zé, obrigado! A chuva diminuiu, acho que dá pra continuar!”.

Eram 15 horas, ele tinha três celulares molhados no bolso, sapatos e carteira molhados. Agora também tinha muita coisa pra pensar e aquele sabor de ‘mundo de verdade’ na boca...