Nordeste brasileiro. Era chuvoso o outono em uma das praias da
Bahia. Terça feira à tarde. A chuva forte recomeçara e não havia mais abrigo para
quem ia de um lugar a outro tentando aproveitar a estiagem.
Seguiu em passos resolutos entre poças e carros que passavam
dispostos a aumentar o banho de chuva dos pedestres. Pensava: é difícil estar
numa guerra vestido para um jantar, é mais difícil se entregar à desejada
brincadeira de criança, enquanto se está vestido de adulto.
Metros à frente via a tenda de água de coco do Sr. José, o Zé do
Coco.
Lhe chamou a atenção ver o seu Zé tirando com um cabo de
vassoura a água acumulada na lona. Os bolsões derrubando água, formando poças em
frente à tenda.
“E o coco seu Zé?”
“Dois e cinquenta o gelado, dois real o natural”.
O Sr. José tinha 70 e poucos anos e sempre trabalhara com coco.
Quando mais novo, “buscava o coco lá em cima no coqueiro”, com 19 assumiu a
banca do pai que morreu novo, de “andaço”.
“Andaço seu Zé?”
“É meu filho, a dor andava. Começô no pé, depois foi subindo,
foi pra perna, inchô o estômago, foi pará no peito e parou ali e ali fez tudo
pará junto com ela”.
“Mas e então, vale a pena vender coco seu Zé?”
“Olha meu filho, se vale a pena eu não sei, meus neto busca os
coco, meu filho traz pra mim no carrinho de supermercado, nóis tira um troco. Mas
a melhor parte é que nóis une o mundo de verdade com os moço da cidade grande
que nem o sinhô”...
Ele ainda olhava pro seu Zé tentando entender que tal união, que
mundo de verdade era aquele.
Ainda cheio de sorriso o Sr. Zé concluía: “É meu filho, não tem
ninguém da cidade grande que passe aqui, faça chuva ou faça sol, que pegano o
coco comigo, ao tomá o primeiro gole, não faça essa cara de criança que tá
mamando como o sinhô fez agora há pouco. É a cara de quem prova da natureza meu
filho, o mundo de verdade é esse aqui. Aquele que vocês montaram lá eu só vejo
pela TV, mas eu num quero ir nunca-nunca visitá”.
Com essa, o sorriso do outro lado dizia: “Até mais seu Zé,
obrigado! A chuva diminuiu, acho que dá pra continuar!”.
Eram 15 horas, ele tinha três celulares molhados no bolso, sapatos
e carteira molhados. Agora também tinha muita coisa pra pensar e aquele sabor de
‘mundo de verdade’ na boca...
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