segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

A_Flora e Fogo (Parte 2)



Deixa vir, tente manter minha voz na superfície do seu entender, sem sair desse sono profundo.
Me ouça apenas, sei que é estranho, você nunca me viu, não sei se lembra da minha voz, minha menina, eu tenho tanto pra te falar, a vontade que tenho de te ver sorrindo quando o vento bate nos seus cabelos, é tamanha...não, não me abraça! Ainda é cedo. Embora minha saudade seja para sempre.

João observa Flora dormindo. Tão linda! Lembra em tudo sua mãe, em cada suspiro, quando se vira na cama e se acomoda, puxando com força o travesseiro para si, 'um anjo se confortando entre as nuvens', ele pensa.
João não se permite dormir, velando o sono da filha.

Como perdeu Maria, jamais de novo.
Naquele dia, desistiu de dormir, para sempre.

E vai até ela de meia em meia hora, entre olheiras e os pés arrastando, lhe testar a temperatura, com as costas da mão no rosto pequeno de menina.
É um alívio sentir que não há febre alguma. Devagar, lhe escorrem as lágrimas, como se vertessem entre as rugas, parece suor. É alegria.

- Eu te amo, pai - ainda dormindo, ela diz, quando sente o pai lhe cobrindo com um lençol florido que Maria adorava. Seu nome nasceu ali, com Maria admirando o lençol em outra noite quente, de 14 verões atrás.

- O pai te ama mais! Dorme amor...
João queria tomar qualquer sonho ruim pra si.

Um dia enfim o pai dormiu, e não adiantou chamar, ele não ouvia.

- Maria! Não sei nem por onde começar.
- João! Calma, descansa um pouco, já não faz calor...

 Ela já na superfície das águas, mas querendo ir fundo, entender.
- Espera, volta! Quem é você?

- Volto, amor! Estarei sempre aqui...

Élinson Martins 27/10/2016 (vem aí a parte 3! ;)

Link para a parte 1:

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